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A pequena miúda do cerrado goiano

Tamara do Carmo

O que é a poesia?

Unknown Track - Unknown Artist
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Goiás é um estado com uma diversidade cultural grande, seja na sua comida típica, cavalhadas, festa do Divino ou as violas caipiras. Localizado no Centro-Oeste brasileiro, coberto pelo cerrado e com uma fauna e flora abundante, ocupa 340.111,376 km² do território nacional. Sua população, estimada em 6.610.681 de habitantes segundo estimativa do IBGE, abraça as artes de uma maneira transcendental, perpetuando nomes na história nacional, como Cora Coralina, Yêda Schmaltz, Bernardo Élis, Antônio Poteiro, Siron Franco.

 

 

Com um ar mais interiorano e uma cultura ligada à arte, ainda hoje o estado revela grandes talentos contemporâneos, principalmente, na literatura. Dheyne de Souza, 32 anos, é um exemplo dessa nova geração que tem como maior janela de divulgação a internet. Com um blog literário, escreve poemas, excertos e e-books. Não afeita ao termo inspiração, a autora conta que prefere viver suas histórias. “Às vezes, um vento me faz sentir uma dor que, de algum jeito, entorna em mim uma sensação que, às vezes, consigo fazer verso. Um som. Um cheiro. Uma memória. Um olhar”, define a artista. Absorvendo tudo que ia aprendendo, Dheyne, já na Universidade Federal de Goiás cursando Letras e com o incentivo de pessoas, foi amadurecendo e revelando sua obra.

 

 

Os artistas goianos, como revela Dheyne, têm uma relação bem estreita. “Há muitos poetas, músicos, artistas plásticos, dançarinos, enfim, uma gama de artistas muito talentosos em Goiânia. Tenho amizades imensas com essas pessoas e aprendo muito a cada encontro, riso, xícara de café ou chá. Às vezes, fazemos algumas reuniões, seja em casa, seja em algum evento”, comenta.

 

Mesmo em seu estado com algumas leis de incentivo, a publicação de obras atualmente é mais canalizada via internet. Isso é uma realidade hoje e permite maior interação entre a produção e a divulgação de obras, graças à liberdade que a rede mundial de computadores traz para os autores. “Há uma série de coisas boas na internet”, observa Dheyne. “Acho uma mídia fundamental para criação, divulgação, contato e produção na arte contemporânea”. Os autores brasileiros convivem com uma realidade onde editoras nacionais não abrem espaço para pequenos escritores em seu catálogo. “Em todo o país, a literatura, especialmente a poesia, tem sido pouco lida, pouco valorizada e pouco incentivada, infelizmente”, diz, lamentando.

Fotosgrafias: Arquivo pessoal da escitora

Nesse caminho, de uma produção independente, o e-book é uma forma que os escritores podem utilizar para lançar sua obra. “Gosto do formato e-book, é uma publicação gratuita, qualquer um pode baixar a qualquer tempo”, pondera Dheyne que tem quatro e-books: “Pequenos Mundos Caóticos”, que também tem uma versão impressa, “Ana e as Cartas” com o poeta Wilton Cardoso, “A Parlenda da Menina – Rima” e “Visitas a Santiago” em parceria com o amigo e ilustrador Santiago Régis.A menina que cresceu bem no interior de Goiás e que tinha uma sede insaciável de apreender e se dizendo reservada, Dheyne é mais um do talento contemporâneo brasileiro, que ganha o mundo fora de seu estado através da internet. Para conhecer sua obra e fazer o download de seus e-books, basta clicar aqui. 

Dheyne de                                             

Souza                                      

                                                  por ela mesma

“Dheyne de Souza nasceu. Foi em 1983. Era prematura, miúda, afeiçoada ao choro, depois ao rastro disso talvez, e, dizem, não muito afeita a risos, nem a todos. Cresceu. Acho que ela tem lados diabólicos – ora, todos têm. Creio que omite muito – ora, vamos, quem não? Imagino que sofra – e? Ela confessou-me não tão recentemente que lida com ela de maneira pacífica quase sempre, ultimamente, pois aprendeu a rir um pouco mais de si, quando, por exemplo, emaranhada em vírgulas, dá-se conta que nem usa muito til, o cômico fura e nisso não raro atormenta, e nesse som de esquina, para. Por isso precisa do só, da nuvem que passa, que sempre passa, do olhar que a vaca corta numa fatia muito simples do vento, no torto do outro caído no cansaço de um dia ameaçadoramente igual, no riso mentido da folha que solta vazia, no osso do verso. Adiantou-me também, de viés, que enfrenta momentos de guerra, de sombra, de sonhos abertos. Corta o avesso dos pulsos, morde a língua na prosa, bate a cabeça nas paredes e não-rimas, mas, diz, o pior é quando se maltrata em verbo bastante, ela arranha o que não devia, o que não podia, e o que depois se ocupa em soprar. Amável. Eu acredito que não seja rouca, ainda.”

ENTREVISTA

 

Tamara do Carmo: Como foi sua jornada na literatura? O começo, as dificuldades e alegrias.

Dheyne de Souza: Acho que a jornada começou desde criança. Gostava de ler gibis e depois livros literários infantojuvenis e alguns livros “proibidos” que havia em casa, aqueles para maiores de 18 anos. A grande dificuldade que sentia era que quase não tinha acesso àquilo que eu ainda não sabia como se chamava, mas depois achei semelhante com “cultura”. Cresci num interior bem interior e nem sempre havia como acessar tudo que eu tinha vontade. E eu sempre tive uma sede insaciável, que ainda me persegue – talvez hoje um pouco mais rota, mas ali. Mas eu queria aprender tudo, mesmo sem saber que era esse tudo. Hoje, olho pra trás, e acho que, se houvesse condições, eu teria feito literatura, filosofia, dança, teatro, música, artes plásticas, fotografia, balé. Achava balé tão bonito, mas. Pensando bem agora, enveredei por vários desses caminhos mais tarde. E são, sem dúvida, alegrias. Gosto de dificuldades. Depois, já no curso de Letras na Universidade Federal de Goiás, fui amadurecendo a escrita e as leituras, fui conhecendo pessoas que me ajudaram bastante a mostrar a tal da obra. Foi outra grande dificuldade. Então, comecei a ter blog, a participar de saraus, reuniões, eventos que envolviam poesia e criação poética, a publicar e-books, a compreender que a criação poética é muito mais parte de mim que, às vezes, o mundo.

 

Tamara do Carmo:Qual é a sua inspiração?

Dheyne de Souza: Bem, não sou afeita a esse termo. Preciso de ar, desinência verbal, silêncio, epifania. Acho difícil dizer sobre inspiração, leitmotiv, essas coisas. Uma vez escrevi isto (não acho que seja uma resposta à pergunta, mas não sei como responder; não sei como responder, aliás, a muita coisa). 

 

Tamara do Carmo: Como é sua rotina para a escrita? Escreve todos os dias? Precisa viver histórias para poder escrevê-las?  Qual a sua motivação?

Dheyne de Souza: De um modo geral, consigo escrever mais quando consigo ler mais. Tenho lido especialmente poesia ou prosa contemporâneas. Vivo as histórias na mente, eu poderia dizer. Às vezes um vento me faz sentir uma dor que, de algum jeito, entorna em mim uma sensação que, às vezes, consigo fazer verso. Um som. Um cheiro. Uma memória. Um olhar. Uma pausa do trânsito de existir.

 

Tamara do Carmo: No seu estado existe uma cultura de apoio à literatura regional? Se houver, Dheyne de Souza: como é, e se não o que acredita que poderia ser realizado?

Há leis de incentivo. Acho que, de um modo geral, em todo o país a literatura, especialmente poesia, tem sido pouco lida, pouco valorizada e pouco incentivada, infelizmente.

 

Tamara do Carmo: E a experiência da publicação de seu livro? Como foi o processo para lançá-lo? (Os e-books).

Dheyne de Souza: Eu tenho um livro impresso, o “Pequenos Mundos Caóticos”, que também tem uma versão em e-book. Tenho um e-book em parceria com o poeta Wilton Cardoso, chamado “Ana e as Cartas” – nesse livro, eu sou a autora dos poemas, que são cartas, à Ana, e o Wilton escreve as cartas como Ana; adorei essa experiência de criação. Tenho mais dois e-books, ambos em parceria com Santiago Régis, um amigo e ilustrador de muito talento (que hoje está em Belo Horizonte-MG). Gosto do formato e-book, é uma publicação gratuita, qualquer um pode baixar a qualquer tempo. Estão, aliás, todos no blog. Quanto a processo de lançamento, não gosto disso de lançar e noite de autógrafos e blá, blá, blá. Nunca tive lançamentos. Apenas posto os e-books, divulgo no Facebook e é isso. Acho que sou meio tímida e outro meio chata, em medidas inexatas.

 

Tamara do Carmo: Como é o relacionamento com outros escritores regionais, há uma ligação entre vocês?

Dheyne de Souza: Há muitos poetas, músicos, artistas plásticos, dançarinos, enfim, uma gama de artistas muito talentosos em Goiânia. Conheço vários. Tenho amizades imensas com essas pessoas e aprendo muito a cada encontro, copo de cerveja, riso, xícara de café ou chá. Às vezes, fazemos algumas reuniões, seja em casa, seja em algum evento. Fizemos, por exemplo, em 2010 ou 2011 um evento chamado Blogarte, destacando justamente a arte nos blogs. Há uma série de coisas boas na internet.

 

Tamara do Carmo: Eu tomei conhecimento do seu trabalho pela internet, gostaria de saber qual a importância dela para a literatura contemporânea, ela tem sido uma ferramenta de divulgação sem fronteiras, levando sua obra ao mundo. Como você a utiliza?

Dheyne de Souza: Eu gosto bastante da internet. Aliás, foi por meio de blog que comecei a perder um pouco da timidez de mostrar o texto e é nela até hoje onde mais “interajo”, considerando minha pá de reserva, que aí já é questão de persona, feliz ou infelizmente. Mas acho uma mídia fundamental para criação, divulgação, contato e produção na arte contemporânea.

 

Tamara do Carmo: E a facilidade que um e-book trouxe para escritores nacionais em publicar suas histórias? O financiamento coletivo é uma nova oportunidade de o escritor publicar sua obra? No seu caso, o e-book abriu um novo mercado para você?

Dheyne de Souza: No meu caso, o e-book não abriu mercado. Aliás, acho que poucos já leram os e-books que postei. Mas é que não tenho muita aptidão para divulgação – e comércio –, talvez o problema esteja aí. Outra vantagem com a rede mundial de computadores é uma interação mais direta com o seu público.

 

Tamara do Carmo: Como você se relaciona com eles, tem um blog, rede social?

Dheyne de Souza: Tenho blog, Facebook e e-mail. Sou meio reservada, mas, sempre que há procura, procuro me relacionar com o público. Daí, aliás, já surgiram muitas parcerias e experimentos de escrita e de arte que me são muito valiosos.

 

Tamara do Carmo: Exerce outra atividade além da de escritor?

Dheyne de Souza: Sou professora de redação – o que, de certo modo, é contíguo ao ofício de escritor. Mas meu trabalho com redação, até por conta do público-alvo, lida bastante com as normas da língua padrão. Já na literatura, adoro jogar com essas normas, burlá-las, recriá-las, pervertê-las.

 

Tamara do Carmo: Atualmente o Brasil reconhece seus escritores contemporâneos? Há uma valorização da obra de autores locais por grandes editoras?

Dheyne de Souza: Não acho que sou o perfil adequado para responder a essa pergunta. Mas não acho que o Brasil reconheça, como deveria, seus escritores contemporâneos – e aí já desde o currículo escolar mesmo. Acho um problema fundo e grave.

 

Tamara do Carmo:A mídia local divulga o trabalho dos escritores? (Seja TV, impresso, rádio e internet). Já teve reportagens sobre você ou sua obra?

Dheyne de Souza: Especialmente na internet ou algum impresso mais, digamos, “marginal”. Já tive entrevistas publicadas em jornal e na internet. A arte está presente na sua vida desde a infância, “cresci num interior bem interior e nem sempre havia como acessar tudo que eu tinha vontade. E eu sempre tive uma sede insaciável, [...] de aprender”, revela a poetisa.

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